A Missão brinquedOPA é uma iniciativa de pessoas comuns, que decidiram seguir o ideal jesuíta de amar e servir nas áreas em que mais se precisa de ajuda.

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Das refelxões imagéticas (II)



O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.


Manuel Bandeira.
Rio, 27 de dezembro de 1947



Relações possíveis da foto-poema acima :

O ‘boneco azul’ não tem ao certo uma identidade: seria um gato, um cão ou, quem sabe, um rato? Não é, por certo, um herói! Nenhum ‘super-homem’, ou ‘Super-Bicho’ (está parecendo mais um ‘Infra-Bicho’)

Seus olhos demonstram confusão, alinearidade (círculo esquerdo contrapondo-se a quadrado direito), mas, ao mesmo tempo, pode querer indicar que sua visão de mundo é complexa: cada olho vê o que quer, vê diferente...

Sua voz foi calada, costurada, pois, cúmulo, há falta até de lábios pra expressar-se.

Esse ‘bicho azul’ não é um homem! Mas foi feito por mãos humanas: trata-se de um trabalho feito em cooperativas por moradores de rua. Esses sim que, ainda hoje, quando acham alguma coisa pra comer, muitas vezes, não examinam nem cheiram: engolem com voracidade.

Contudo, há ilhas de resgate e socialização, posto que agora, nesse caso do nosso “Super-Infra-Bicho”, o ‘bicho’ não mais um homem, mas uma representação simbólica, revolucionária e silenciosa, de mãos e mentes que não mais mendigam e sim trabalham e criam realidades para um mundo melhor.

terça-feira, 21 de agosto de 2007

Das Reflexões Imagéticas (II) Ensaios Marajoaras

"Qin Shi Huang Di foi o primeiro Imperador que uniu a China sob a mesma dinastia, realizador de grandes reformas sociais e econômicas. Os Qin governaram de 211 a 206 antes de Cristo, sendo responsáveis pela implantação do conceito de império entre os chineses.
O Imperador faleceu há mais de 2 mil anos e foi sepultado junto a um exército de guerreiros de terracota, cuja principal missão era zelar por ele no além. Os chineses acreditavam na continuação da vida na terra, após a morte..." em: http://www.sergiosakall.com.br/asiatico/
china-soldados.htm

Explicando: Estando eu ajudando em uma brinquedoteca em Marajó- PA nesse ano da Graça de 2007, eis que me deparo com a cena que ao lado se encontra -
a foto que se vê ao lado é de um desses soldados de terracota acima ditos, que foi doado para a brinquedoteca em que trabalhei e logo reinventado com um pitada de regionalismo e criatividade Paraense-Marajoara.

Bem, essa imagem é uma tradução do que as crianças de lá espontânea e naturalmente querem dizer ao mundo( ao menos essa foi a leitura que fiz dessa foto):

"Nem todos conhecem quem são os soldados de terracota. Quem os conhecessem bem não lhes poria um sombreiro, como se ele fosse um boneco qualquer... Mas quem liga pra isso, pois o fato de ele ser um soldado chinês milenar representativo de toda uma cultura não o impede de ficar mais bonitinho com um sombreiro de tricô!!! Repetimos: nem todos conhecem quem são os Soldados de Terracota e ainda bem que é assim, pois isso nos permite viajar com ele (com sombreiro e tudo) pelo Rio Arari até chegarmos, quem sabe, ao Rio Amarelo..."


Ir. Epifânio

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Saudades de Jenipapo

Jenipapo é nome de fruta e nome de lugar. Tanto um quanto outro são cheios de sabor. E assim como uma fruta leva tempo para amadurecer, Jenipapo também. São longas horas de barco para ali chegar, são longas horas de conversa para roçar-lhe o espírito, são longas horas de saudade com os rostos que se aderem à sua memória quando lá se vai... e só então percebe-se que Jenipapo não sairá jamais de você. Mas isso é muito bom, Jenipapo é um lugar alegre apesar de tudo, um lugar de crianças, de jogos e de brincadeiras. Numa palavra, é sinônimo de esperança. Ali foi plantada uma semente, a BrinquedOPA , que germinou em outras cidades. Ali foram plantadas sementes em muitos corações cheios de desejo de amar e servir, de conciliar fé e justiça.
E o cheiro das frutas saborosas vai muito longe, muito além do terreno dos pomares. Essa mensagem quer comunicar a você um pouco da alegria dessa experiência. Junte-se a nós e pense nas crianças de Jenipapo e de Vazantes, especialmente durante esses dias. Reze por aqueles que as estão visitando agora. Depois não se esqueça de voltar seu coração para o mundo concreto que o rodeia e peça ao Pai a graça de ser missionário exatamente aí, no aqui e no agora de sua existência.
Deus é generoso!

Pe. Li

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Missão Vazantes 2007

Chegamos em Vazantes na noite do dia 15 de julho, acho que mais ou menos às 20h. O céu estava lindo, cheio de estrelas, céu bonito do sertão do Ceará... Fomos bem recebidos e logo nos acomodamos na casa da Estação Cultura do Fé e Alegria. O grupo era composto por Laíze (Teresina), Adriano (Fé e Alegria - Natal), Keise (Recife) e eu, Simone. No dia seguinte fomos olhar onde iria ficar a brinquedoteca, pois a sala ainda não estava pronta. Ajudamos, então, a arrumar espaço para instalar a brinquedoteca numa sala que, no momento, estava funcionando também como biblioteca e lugar de muitas outras atividades. Depois ajeitamos os brinquedos que Laíze e eu tínhamos levado, além dos que já estavam por lá (os brinquedos de SP e BH ainda não tinham chegado em Fortaleza). O primeiro dia foi, assim, só de arrumação e reunião com os voluntários da brinquedoteca. Na reunião apresentamos a missão e a proposta da brinquedOPA, e perguntamos quem gostaria de ser voluntário, marcando para o dia seguinte uma capacitação com eles. No segundo dia, além dessa capacitação dos voluntários, fizemos uma ótima reunião com as mães. Havia sete voluntários, fizemos atividades, dinâmicas com o grupo para trabalhar o espírito de equipe, vimos a importância da brinquedoteca para o desenvolvimento da criança, e junto com eles fizemos o planejamento dos dias de funcionamento de acordo com a possibilidade de cada um. Dividimos as idades e separamos os dias para cada grupo por idade, como se vê nesse quadro:
SEG
TER
QUA
QUI
DOM
Grupo A
Grupo B
Grupo B
Grupo A
Grupo C
Grupo D
Grupo D
Grupo C
Grupo E
Grupo A- 8 à 12 anos
Grupo B - 4 à 7 anos
Grupo C - 4 à 7 anos
Grupo D - 8 à 12 anos
Grupo E - 8 à 12 anos
Inicialmente funcionamos assim. Depois o quadro se modificou conforme os dias em que apareceram mais crianças e a abertura da BrinquedOPA na sexta-feira à tarde também (com o grupo E). Foi feita uma avaliação de acordo com a necessidade da comunidade, pois a idade das crianças diminuiu com relação ao projeto inicial. Conversamos sobre isso com os voluntários, mostramos as dificuldade de se trabalhar com crianças com menos de 7 anos, mais era uma necessidade da comunidade. Pelo fato de Fé e Alegria ter muitas atividades em muitas mães participam e não tem onde deixar os filhos, havia um grande número de crianças entre 4 e 7 anos. Os voluntários participaram dessa decisao.
O funcionamento da BrinquedOPA foi iniciado como deveria ser quando não estivéssemos mais lá. Ficamos um pouco ausentes em alguns momentos para que os próprios voluntários tomassem a iniciativa de conduzir o grupo de crianças. A BrinquedOPA começou a funcionar na quarta-feira, terceiro dia de missão. Tudo deu certo, atendemos por volta de 75 crianças. Depois de um tempo algumas crianças não apareceram mais, outras crianças surgiram, mais a brinquedoteca não parava. Ao longo da missão apareceram mais voluntários e isso foi muito bom. Como criança se comporta como criança, não é difícil imaginar o olhar e o comportamento delas ao entrarem na brinquedoteca.
Keise não pode ficar até o final da missão e Juliana de Teresina apareceu na segunda semana. Ficamos a maior parte do tempo com um grupo de 4 pessoas. Na segundo semana, no dia que Juliana e Laise foram embora, eu fui à Fortaleza buscar os outros brinquedos que haviam chegado de SP e BH. Vocês podem imaginar a aventura: fiz a viagem num caminhão de carga de areia. Foi muito engraçado, mas cansativo. É muito melhor viajar de barco.
Fazíamos as orações sempre no final da tarde, na casa da Irmã Albani, uma pessoa maravilhosa. Tivemos casamento, festival de quadrilha, caminhadas na estrada, banho de rio, açude com direito a piaba picando os pés, festinhas que a comunidade fazia para nós, refeições alguns dias em outras casas... Uma parte do grupo fez visitas à comunidade junto com irmã Albani.
No ultimo dia fizemos uma reunião com todo os voluntários, depois de arrumarmos a brinquedoteca com os brinquedos que chegaram. Fiz até e-mail para eles, para mantermos contato mais facilmente. Procurei deixar as coisas bem organizadas, e agora estou na saudade. Acabei de ter noticias de lá e a brinquedoteca ainda funciona (com alguns probleminhas bobos, que posso ajudar a resolver via net).
Senti muita falta de uma pessoa para fazer o acompanhamento espiritual. Havia Irmã Albani, que é uma pessoa maravilhosa e esteve conosco em todos os momentos. Mas senti falta, talvez falta de ter Robertinho por perto.
O melhor depoimento que tive foi de um rapaz com 18 anos conhecido na comunidade como Tonton, voluntário do Fé e Alegria. Estávamos conversando uma noite sobre como foi bom ser criança e recordando nossa infância, e é claro que nesses papos aparecem coisa lindas e engraçadas. Ele olhou para mim e disse: "Preta eu não tive infância, não fui feliz. Sofri na minha infância, nunca tive brinquedos, lá em casa eram muitos irmão só tive um carro, uma vez, e meu tio quebrou ele bêbado. Naquele dia em que eu fui na brinquedoteca eu estava muito triste e quando entrei e vi um carro que era parecido com aquele que meu tio quebrou e voltei à minha infância e a tristeza acabou. Ficar na brinquedoteca me faz bem e me faz feliz". Seus olhos se encheram de lágrimas, ele não pode mais falar e é claro que eu também fiquei emocionada e vi o quanto valeu a pena estar ali. Ele já estava um bom tempo afastado do projeto e, nas vezes em que fui lá, nunca o vi tão empolgado com uma coisa. Tonton passou todos os dias conosco e ajudou um bocado na brinquedoteca. Como vocês sabem, a comunidade tem muitos problemas com drogas - principalmente com o álcool. É um problema passado de pai para filho, dura realidade de lá.
Acho que é só isso pessoas!!! A missão foi maravilhosa. graças a Deus. Tudo deu certo... e lembram que eu pensei em desistir? Acho que, para mim, foi uma das missões mais difíceis. Não é somente pela responsabilidade que tive que assumir sozinha. Mas alguns acontecimentos em minha vida me fizerem pensar muito e ver muitas coisas que não via antes. Cada missão é uma nova experiência, eu tive mais uma - e grande. Sempre nas orações lembrava de Jenipapo e imaginava o que estavam fazendo naquela hora. Saudade grande de lá...
Simone Dias

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Das refelxões imagéticas (I)


O bicho

Vi ontem um bicho
Na imundície do pátio
Catando comida entre os detritos.

Quando achava alguma coisa,
Não examinava nem cheirava:
Engolia com voracidade.

O bicho não era um cão,
Não era um gato,
Não era um rato.

O bicho, meu Deus, era um homem.

Manuel Bandeira
Rio, 27 de dezembro de 1947


Relações possíveis da foto-poesia acima :

O ‘boneco azul’ não tem ao certo uma identidade: seria um gato, um cão ou, quem sabe, um rato? Não é, por certo, um herói! Nenhum ‘super-homem’, ou ‘Super-Bicho’ (está parecendo mais um ‘Infra-Bicho’)

Seus olhos demonstram confusão, alinearidade (círculo esquerdo contrapondo-se a quadrado direito), mas, ao mesmo tempo, pode querer indicar que sua visão de mundo é complexa: cada olho vê o que quer, vê diferente...

Sua voz foi calada, costurada, pois, cúmulo, há falta até de lábios pra expressar-se.

Esse ‘bicho azul’ não é um homem! Mas foi feito por mãos humanas: trata-se de um trabalho feito em cooperativas por moradores de rua. Esses sim que, ainda hoje, quando acham alguma coisa pra comer, muitas vezes, não examinam nem cheiram: engolem com voracidade.

Contudo, há ilhas de resgate e socialização, posto que agora, nesse caso do nosso “Super-Infra-Bicho”, o ‘bicho’ não mais um homem, mas uma representação simbólica, revolucionária e silenciosa, de mãos e mentes que não mais mendigam e sim trabalham e criam realidades para um mundo melhor.